jun 25, 2019 Cabedelo, Destaque, Geral, João Pessoa, Justiça, Ministério Público 1629
O jornal Correio da Paraíba dedicou, na edição desta segunda-feira (24), uma página inteira a uma reportagem com os pormenores da prisão do empresário Roberto Santiago, que já ultrapassa a marca dos 90 dias atrás das grades. O jornal Correio da Paraíba dedicou, na edição desta segunda-feira (24), uma página inteira a uma reportagem com […]
O jornal Correio da Paraíba dedicou, na edição desta segunda-feira (24), uma página inteira a uma reportagem com os pormenores da prisão do empresário Roberto Santiago, que já ultrapassa a marca dos 90 dias atrás das grades.
O jornal Correio da Paraíba dedicou, na edição desta segunda-feira (24), uma página inteira a uma reportagem com os pormenores da prisão do empresário Roberto Santiago, que já ultrapassa a marca dos 90 dias atrás das grades.
O jornal também faz uma comparação entre as estratégias da Operação Xeque-Mate e da operação Lava-Jato, e vê semelhanças nas ações das forças tarefas de Curitiba e da Paraíba.
Confira o texto na íntegra abaixo
94 dias de cárcere: o que está nos bastidores da prisão de Roberto Santiago?
Há exatos 94 dias, o empresário Roberto Santiago iniciava sua saga no cárcere. Os primeiros dois meses foram passados numa cela do 1º Batalhão da Polícia Militar – levou um ventilador (não um ar condicionado, como se especulou à época), uma bíblia e imagens sacras. Uma bagagem leve, sinalizando (talvez) a crença de que sua estadia seria breve.
Estava enganado: desde o dia 18 de maio, divide com outros presos da Operação Xeque Mate – deflagrada pelo Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (Gaeco) – uma cela com 25 beliches e um banheiro sem porta na Penitenciária de Segurança Média de Mangabeira.
O alongamento da prisão – feita em caráter preventivo – e as sucessivas negativas para encerrá-la, alimentam uma onda de questionamentos que se forma nos bastidores jurídicos com um foco essencial: por que Roberto Santiago continua preso? Em parecer encaminhado à Justiça, o Ministério Público Federal tentou entabular a justificativa: “O paciente (Roberto Santiago) e os demais réus gozam de grande influência política e social no município, ostentando efetivo potencial de embaraçar o andamento das investigações e constranger testemunhas”
Traduzindo o juridiquês, o MPF acredita que Santiago é rico e prestigiado demais. Solto, poderia influir nas investigações. Até diz que já o fez: um dos réus no processo, o radialista Fabiano Gomes, teria dito que foi pressionado – por meio de outro colega de profissão, Rui Dantas – a manter silêncio. Roberto e Rui negam. Recentemente, em depoimento à PF, Fabiano abrandou o tom da denúncia: não teria recebido pressão e sim uma sugestão do colega. Detalhe: Rui Dantas nunca foi convocado para prestar depoimento. Mais: a despeito da denúncia ter servido de alegação para a prisão, Santiago não chegou a ser formalmente acusado por obstrução de justiça – crime previsto no Código Penal e passível de pena de detenção.
Xeque mate?
No mesmo parecer, o Ministério Público admite que Santiago reúne condições favoráveis para ser solto: “como a primariedade, profissão e residência fixas”. Mas, ato contínuo, minimiza a conjuntura que beneficiaria o empresário, argumentando que essas características, por si só, não autorizariam a “revogação da prisão preventiva, quando existam elementos hábeis a recomendar a manutenção da medida cautelar”.
São justo esses tais elementos que estão em xeque. E a peça central nesse tabuleiro é o artigo 313 do Código de Processo Penal, que estabelece os critérios para a decretação de prisão preventiva. Diz a lei que as preventivas podem ser decretadas para garantir a ordem pública e econômica (impedindo que o réu, solto, continue a praticar crimes); por conveniência da instrução penal (evitando que o réu aja de forma a atrapalhar a investigação) e para assegurar a aplicação da lei penal (inviabilizando fugas).
O MP insiste – e o juízo endossa – que o patrimônio de Roberto Santiago oferece todos esses riscos. Em interpretação livre, atestam que sua condição de rico o faz perigoso para a continuidade das investigações. Era o que ele mais temia – e em um nível que o fez entregar voluntariamente as senhas de seus celulares à polícia, se afastar de amigos poderosos e comunicar com antecedência suas ausências de João Pessoa, informando itinerários e endereços.
A defesa do empresário apostava que, com esses cuidados, ele se blindaria de ser visto como ameaça à ordem pública e à instrução penal. E que tampouco representaria risco de fuga. Nas petições para relaxamento de prisão, enumeraram mais um punhado de motivos pelos quais o empresário não teria como atentar contra a ordem econômica. A principal delas é que Cabedelo – cidade onde ele teria, segundo o Gaeco, ocupado a chefia financeira de uma organização criminosa ao longo da gestão do ex-prefeito Leto Viana – tem novo gestor, opositor do antecessor – o que esvaziaria as ameaças de violações. Não funcionou. Atrás das grades – oscilando entre estados de serenidade e inconformismo – a saga de Roberto Santiago continua.
Réplica tabajara da república de Curitiba?
Inevitável fazer a conexão entre a prisão de Roberto Santiago e a de Marcelo Odebrecht. Na Paraíba, a detenção do “dono do shopping” provocou assombro análogo ao que suscitou, no país, a prisão do mandachuva da então maior empreiteira brasileira.
As semelhanças que os unem se separam com um detalhe singular: enquanto o empreiteiro construiu seu império com negócios juntos ao setor público, Santiago militou exclusivamente na esfera privada.
Odebrecht passou dois anos e meio preso. Só saiu depois de fazer delação. Na Paraíba, onde duas grandes operações estão em curso – além da Xeque Mate, o MP comanda a Calvário – todos os detidos continuam atrás das grades.
As exceções seguiram os ritos ditados a partir de Curitiba: só após a confissão e ou delação (vide casos da ex-secretária Livânia Farias e da ex-primeira dama de Cabedelo, Jacqueline França, liberada depois da delação feita pelo esposo, Leto Viana).
Para alguns juristas, o que está em curso seria uma versão 2.0 da ditadura: sai de cena a tortura física, entra a psicológica. Produzindo, para além das seqüelas individuais, efeitos colaterais que danificam o processo legal. Advogado, ex-procurador da República, docente titular da Universidade Estadual do Rio de Janeiro e pós-Doutor em Direito, o professor Juarez Tavares faz parte desse time de juristas – cada dia mais numeroso – que olha com desconfiança para o rito justiceiro em ação no país.
Esta semana, em entrevista ao site Conjur, foi taxativo: “Se o combate à corrupção destrói direitos fundamentais, não combatemos a corrupção, destruímos a democracia”. O entendimento de Tavares tem ecos no Estado: “Estamos vivendo em terras tabajaras tempos sombrios, fruto do processo penal midiático que o juiz Moro – e agora Ministro da Justiça – inaugurou e protagonizou, e agora é refém, desde que promoveu, alimentou e impulsionou a instalação da mídia punitiva e opressora com seus vazamentos seletivos”, avalia o advogado, filósofo e educador Alexandre Guedes, coordenador do Núcleo paraibano da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia.
O advogado Gilvan Freire discorda: “O Estado, que atua para atender o interesse público, deve ser duro e usar todos os recursos necessários para se contrapor ao poderio dos criminosos de colarinho branco, que têm prestigio e dinheiro. Há uma medição de forças, e se o Estado não demonstra a sua superioridade, sucumbe e o crime vence”.
Os fins justificam os meios? O Núcleo da ABJD-PB emitiu, recentemente, nota contra a prisão da ex-secretária Livânia Farias. Sobre o caso Santiago, Alexandre Guedes admite a falta elementos para opinar, defendendo “análise mais apurada”. Mas não tem dúvidas que, de forma geral, o judiciário brasileiro está promovendo abusos em decretos de prisões preventivas. “Estamos vivendo tempos de Lawfare (Guerra Jurídica).
E está sendo confirmado que alguns juízes (responsáveis pelo cumprimento das leis), promotores de Justiça e procuradores federais – como membros do Ministério Público (responsáveis pela fiscalização da lei /acusação), vêm cometendo desde há muito atos eivados de ilegalidades, descumprindo o que a Constituição Federal prevê (devido processo legal, presunção de inocência, julgamento justo, imparcialidade); descumprindo normas do Código de Processo Penal, e do próprio Condigo de Ética da Magistratura e do Ministério Público”, aponta Guedes.
Gilvan, porém, aprova a simbiose MP-Juízo. “A ação do Ministério Público e do Poder Judiciário, que se dá em razão do interesse do próprio Estado e da defesa da população, tem de possuir a sintonia que decorre de seus fins comuns, que são frontalmente contrários aos interesses e objetivos dos réus nos processos criminais”.
Para o coordenador na Paraíba da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia, essa sintonia é perigosa. Ele defende a necessidade do país voltar a viver sob os auspícios de um Estado Democrático de Direito. E acrescenta, ilustrando com o caso que chama de “Morogates”: “Tenho clareza de que precisamos ter organização e coragem para enfrentar essas ilegalidades para continuarmos a denunciar no mundo todo os crimes que foram cometidos pelo juiz Moro contra um ex-presidente da República, usando o poder que detinha no Judiciário Federal com a cumplicidade do Procurador Deltan Dallagnol”. E arremata: “Perguntemos: se os líderes da Lava Jato fizeram isso com um ex-presidente da República, que saiu do poder com 83% de popularidade, imagina o que não são capazes de fazer com qualquer outro cidadão que venha a ser acusado de algum crime?” Roberto Santiago, da sua cela no presídio de Mangabeira, vem construindo essa resposta.
Perguntas e respostas: acusações e defesas que movimentam o caso Roberto Santiago
O Ministério Público acusa o empresário Roberto Santiago de ter sido intermediador da contratação da empresa M CONSTRUÇÕES E SERVIÇOS para coleta de lixo no Município de Cabedelo. Nos autos do processo, a defesa diz que Roberto Santiago recebeu pedido do gerente da agência do BNB Maykel Alexandre Alves, que atendia o empresário, para que apresentasse o portfólio da empresa M Construções e Serviços – que tinha o interesse em participar da licitação para a coleta de lixo de Cabedelo – ao prefeito Leto Viana. A empresa, porém, nunca teve contrato de coleta de lixo com a Prefeitura de Cabedelo durante gestão do ex-prefeito.
O MP denunciou o empresário por recebimento de repasses mensais do ex-prefeito Leto Viana, que variavam entre R$ 100 mil e R$ 120 mil. A defesa vê especulação e leviandade em relação a amizade do empresário com o ex-prefeito de Cabedelo, que – garante – nunca teria se estendido para além do campo pessoal. E aponta como prova o fato de que, ao longo da gestão de Leto Viana, a Prefeitura de Cabedelo promoveu diversas execuções fiscais exigindo o pagamento de tributos. O empresário – que discorda dos débitos – levou as demandas para o âmbito judicial, pois jamais conseguiu a reconsideração do poder público municipal.
O MP identificou relação suspeita, a partir das conversas registradas no celular de Roberto Santiago, com o empresário Lavanério de Queiroz, que tem participação em três empresas ligadas ao manejo de resíduos sólidos com contratos vigentes na Prefeitura de Cabedelo. Eles têm relações familiares – são concunhados. A própria Polícia Federal, porém, reconheceu que eles não são sócios e excluiu a hipótese de sociedade.
O MP também flagrou conversas entre Roberto Santiago e Maykel Alexandre, gerente do Banco do Nordeste. Nelas, evidenciaram que depósitos foram efetuados para a empresa Compecc, flagrada recolhendo lixo na cidade de Cabedelo em fevereiro/2014, mesmo a empresa não possuindo nenhum tipo de contrato formal para realização do serviço.
A defesa alega que há duas situações distintas – e sem qualquer correlação.
A primeira é que a COMPECC foi uma das empresas prestadoras de serviço contratadas ao longo da construção do Mangabeira Shopping (2012/2014). Após a inauguração, o empreendimento ficou com dívidas junto a várias empresas contratadas para a construção, dentre as quais, a COMPECC. Ainda de acordo com a defesa, a Compecc, por sua vez, devia significativa soma de recursos ao BNB.
Na ocasião, o gerente do BNB, Maykel Alexandre, era o responsável pelo relacionamento do banco com o Shopping e também com a Compecc. Maykel teria visto, então, uma possibilidade de equalização da dívida do shopping com a COMPECC para amenizar a dívida da empresa com o banco. Em dezembro de 2016 foi feita uma primeira transferência e em março de 2017 uma segunda. Assim – sustenta a defesa – por meio de uma transação legal a dívida do shopping com a Compecc foi totalmente liquidada.
A Compecc tem participação na Coleta de lixo de Cabedelo?
A defesa diz que é fato público, veiculado na imprensa à época, que o então prefeito Leto Viana fez uma ação para retirar acúmulo de lixo das ruas de Cabedelo em razão da empresa responsável pela coleta ter suspendido o serviço, contrariada com a não equalização do passivo financeiro existente, constituído durante a gestão de José Maria de Lucena Filho, o Luceninha.
O mutirão “Todos unidos por uma cidade limpa” foi realizado em parceria com diversas empresas privadas da cidade, sem nenhum ônus para a Prefeitura de Cabedelo. A COMPECC participou da ação. O jornalista Fabiano Gomes da Silva diz que recebeu, por meio de Rui Dantas, um pedido de Roberto Santiago para “segurar” os depoimentos de José Maria de Lucena Filho e Olívio Oliveira. Rui Dantas, e posteriormente o próprio Fabiano Gomes, negaram a pressão. E as mensagens do celular do Roberto mostram que o fluxo das mensagens era de Fabiano para Roberto e não de Roberto para Fabiano. Mais: o radialista não apresentou à Polícia seu celular.
Muito além dos shoppings – a presença de Roberto Santiago em João Pessoa
Quando fazia corretagem de terrenos em um escritório apertado no centro de João Pessoa, Roberto Santiago talvez não vislumbrasse o que estava em seu horizonte: a personificação, para muitos paraibanos, do símbolo da riqueza. Os elementos estão todos lá: a mansão de frente para o mar e os carros caros e barulhentos. Suas “meças” de consumo fizeram o restante do trabalho: ele é, de longe, o empresário mais conhecido dos pessoenses, apontado nas ruas como o “mago do shopping”. E – sim – era comum vê-lo nas ruas. Seja acelerando suas máquinas potentes; seja perambulando – sem seguranças – pela orla do Bessa, bairro onde mora com a família. A presença mais constante nas colunas sociais do que no noticiário de negócios também ajudou a construir o simbolismo em torno de sua figura, numa dimensão que acabou ofuscando os (muito) outros ângulos de Roberto Santiago. Entre os quais, o de agente em iniciativas que mudaram a fisionomia da Capital. O Shopping Manaíra, por exemplo, é o maior centro comercial da Paraíba. Em 2008, foi considerado o segundo maior do Nordeste. Atrai cerca de 19,2 milhões de visitantes por ano – multidão que congestionava o trânsito no seu entorno. Incomodado, ele tomou a iniciativa para sanear o problema. Em 2006, formalizou parceria público-privado com a Prefeitura para duplicar e recuperar a Avenida Flávio Ribeiro Coutinho, o Retão de Manaíra. A construção do shopping da zona sul também rendeu para a cidade: a permuta de terreno com o município incluiu a construção da nova academia de polícia, no bairro do Ernesto Geisel.